Eramos três almas.

Parei. Era uma tarde cinzenta, fria e chuvosa, Deus estava chorando,  pensei,  gostava de pensar essas coisas. Não,  não gostava, mas sentia uma enorme necessidade de pensar que Deus com toda a sua magnitude também pudesse chorar.  A rua estava banhada, meu corpo estava banhado, parada ali sem rumo certo, podia observar um mendigo em meio a muitos papelões, trêmulo e faminto segurava um crucifixo, devia está pedindo a Deus que os papelões aguentassem um pouco mais. Mas adiante uma jovem rapariga, sim, rapariga eu disse, com sua saia meio palmo e sua blusa furada...  Retifico-me! Uma alma deserta de emoções parada no meio fio com seus finos retalhos, se a chuva não estivesse a banhar seu rosto naquele exato momento, poderia jurar que aquela alma estava a chorar também. Lágrimas de Deus ou não, aquela chuva densa e sem fim começava a pesar em meu corpo, ardia-me a pele, senti-me culpada, mas culpada pelo quê mesmo? Era só mais uma entre tantas almas perdidas a vagar pelo mundo sem um porto. Levantei um pouco as mãos e fechei os olhos, não tinha um crucifixo mas ainda tinha um pouco de fé e isso bastava,  fiz um pedido quase inaudível; _ Ei cara, engole o choro e escuta, para com isso, deixa quem quer amar, amar! Deixa quem quer viver, viver! Deixa quem morrer, morrer! Coisa chata esse teu jogo de vida traçada, vida lançada, vida imposta! Só estou pedindo um pouco mais de sol para quem tem frio,  um céu azul, talvez, para trazer tranqüilidade aos desesperançosos, o que estou pedindo mesmo é um sorriso teu, um olhar ameno, agente só precisa de um pouco de porto, um pouco de Deus... Esperei angustiada alguma resposta, mas a única coisa que fazia barulho em meio a tudo aquilo era uma densa chuva mesclando-se com o soluçar de três almas perdidas.   

                                                                Samara Santos